Agência FAPESP – Dosar um conjunto de metabólitos produzidos em uma
região cerebral chamada hipocampo pode ajudar os neurologistas a avaliar
se pacientes com epilepsia do lobo temporal – a forma mais comum da doença em adultos – estão respondendo ou não ao tratamento farmacológico.
O
desenvolvimento de um método para fazer essa análise de forma não
invasiva, usando espectroscopia por ressonância magnética, é o objetivo
de uma pesquisa realizada no âmbito do Instituto Brasileiro de
Neurociências e Neurotecnologia (BRAINN),
um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) financiados
pela FAPESP e sediado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O trabalho, conduzido pela pós-doutoranda Luciana Ramalho Pimentel da Silva, foi um dos quatro premiados na última edição do Congresso da Liga Brasileira de Epilepsia (LBE), realizado em junho em São Paulo.
“A
epilepsia do lobo temporal geralmente está associada a uma lesão no
hipocampo, região cerebral relacionada à memória. Nosso objetivo é – em
casos em que existe um tipo de lesão conhecido como esclerose hipocampal
– avaliar os efeitos do controle farmacológico das crises sobre o
metabolismo cerebral”, explicou Silva.
Segundo a pesquisadora,
para alguns dos pacientes em que o tratamento medicamentoso não é
bem-sucedido, recomenda-se a remoção cirúrgica da área cerebral
lesionada como alternativa de controle das crises. Nem sempre isso é
possível, porém, dependendo da região em que a lesão está.
Sob a supervisão de Fernando Cendes, coordenador
do BRAINN e professor da Unicamp, o grupo faz uso da espectroscopia de
prótons por ressonância magnética para quantificar no hipocampo
compostos químicos que atuam como indicadores de alterações estruturais e
funcionais nos neurônios, como o N-acetilaspartato, colina,
fosfocolina, glutamato e glutamina.
“Por
ser uma técnica não invasiva, foi possível obter informações sobre
processos celulares e moleculares em pacientes de perfil variado, até
mesmo aqueles que não são candidatos à cirurgia. Nesses casos, não
teríamos acesso às amostras cirúrgicas do tecido nervoso e o estudo não
seria possível de outro modo”, disse Silva.
Os achados mostram,
segundo a pesquisadora, que as alterações metabólicas no hipocampo de
pacientes com epilepsia do lobo temporal diferem de acordo com o lado em
que a lesão está localizada e com o grau de resposta ao tratamento
farmacológico. O estudo foi feito com 92 pacientes e outros 50
voluntários sem epilepsia.
“Em nossa amostra, pacientes com
diminuição de N-acetilaspartato apresentaram maior risco de controle
inadequado das crises”, contou Silva.
“Existe uma alteração
específica nesse conjunto de metabólicos em pacientes que não respondem
ao tratamento e uma alteração ainda maior naqueles que apresentam
atrofia hipocampal do lado esquerdo do cérebro. Foi a primeira vez que
conseguimos separar quais alterações estão relacionadas ao dano
estrutural e quais são relacionadas à não resposta ao tratamento”,
afirmou Cendes
Displasia cortical focal
Outro trabalho realizado pelos membros do BRAINN, durante o doutorado de Vanessa Simão de Almeida também foi premiado durante o 37º Congresso da LBE. A pesquisa é orientada por Iscia Lopes Cendes, professora da Unicamp.
Nesse
caso, o objetivo é buscar mutações que ocorrem durante o
desenvolvimento do córtex e que poderiam explicar a origem de
malformação cerebral conhecida como displasia cortical focal – uma das
causas mais comuns de epilepsia refratária ao tratamento farmacológico.
Pacientes
com esse problema apresentam uma discreta desorganização na arquitetura
de uma região específica do córtex, que pode ou não estar associada à
presença de células nervosas com estrutura e funcionamento anormais.
“Nosso
objetivo é contribuir para o entendimento das causas genéticas das
displasias corticais focais e identificar os mecanismos moleculares
possivelmente envolvidos na malformação”, contou Almeida.
Para
isso, o grupo avalia por métodos de sequenciamento genômico o tecido
cerebral de pacientes com epilepsia submetidos à cirurgia para remoção
da área afetada pela malformação.
Realizado a cada dois anos, o
Congresso da LBE é considerado o maior evento da área de epilepsia na
América Latina, reunindo entre 600 e 700 pessoas do Brasil e convidados
internacionais.
“Em todas as edições são selecionados por um
painel de especialistas os melhores trabalhos submetidos pelos
estudantes. São quatro prêmios que cobrem as áreas de estudos clínicos,
estudos experimentais, cirurgia e eletroencefalografia”, contou o
coordenador do BRAINN.
Para Cendes, o fato de dois trabalhos do
CEPID terem sido selecionados nesta última edição demonstra que o grupo
tem forte competitividade no contexto acadêmico nacional e até
internacional.
“É sinal de que os resultados que produzimos têm
relevância e impacto. A premiação é boa para o BRAINN e também dá um
incentivo grande para os alunos mais jovens, que ainda estão começando a
carreira científica”, disse.
Fonte: Rede Notícia
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