segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Atividade física, remédio contra a epilepsia

Uma pesquisa da Unicamp junto a um grupo de 80 pacientes com epilepsia atendidos no Hospital de Clínicas (HC) demonstrou que a prática de atividades físicas pode proporcionar diversos benefícios nos aspectos psicológicos deste grupo. O estudo, conduzido pela educadora física Simone Thiemi Kishimoto, relata que houve, entre os praticantes de atividade física, uma melhora significativa na autoestima, na diminuição dos sintomas depressivos, no aumento da resiliência e na percepção sobre a qualidade de vida.
“A epilepsia pode ser considerada como uma das doenças mais estigmatizantes socialmente. A própria origem do nome da doença, que vem do grego e significa ‘ser invadido, dominado e possuído’, demonstra este estigma. A ideia de avaliar os aspectos psicológicos advém, portanto, do fato de que estas pessoas são frequentemente esquecidas e negligenciadas, ficando às margens da atividade física. Elas também estão mais expostas a disfunções sociais, influenciando, deste modo, seus aspectos psicológicos”, situa Simone Kishimoto, que é graduada pela Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp.
A pesquisadora da FEF informa que estudos disponíveis na literatura científica sobre o tema, citados no seu trabalho, já mostram que a atividade física pode diminuir o número de crises epilépticas, além dos benefícios de promoção e prevenção a saúde de forma geral. “Isso acontece porque, durante a prática física, o organismo libera a beta-endorfina, um neurotransmissor que inibe a atividade epiléptica, atuando como um anticonvulsivante natural. Na corrente sanguínea, esse beta-endorfina produz sensações de relaxamento e bem-estar”, informa.
Simone Kishimoto esclarece ainda a diferença entre os termos “atividade física” e “exercício físico”. “Eu avaliei a atividade física, que é diferente de exercício físico. A atividade física é o movimento produzido pelo corpo no dia a dia, com gasto energético, como ir ao trabalho a pé, limpar a casa, subir uma escada, etc. Já o exercício físico é planejado, direcionado a um objetivo. Nadar, correr, caminhar e andar de bicicleta são exercícios físicos. Desta forma, todo exercício pode ser considerado uma atividade física. Porém, a atividade física nem sempre pode ser considerada um exercício.”
Na pesquisa, conduzida como dissertação de mestrado junto ao Programa de Pós-Graduação da FEF, Simone Kishimoto avaliou como a atividade física que já era praticada pelos pacientes interferiu em cinco aspectos psicológicos: percepção sobre a qualidade de vida, autoestima, resiliência, sintomas depressivos e estigma. Destes aspectos, o único que não apresentou melhora significativa foi o estigma, revela a educadora física.
“A atividade física não conseguiu diminuir a percepção de estigma que estes pacientes têm. O termo estigma pode ser definido como uma cicatriz, um sinal relacionado a estereótipos negativos e à rejeição da sociedade. Acreditamos que não houve alterações significativas muito por conta da própria situação de vida do paciente, que trabalha e faz atividade física, mas mesmo assim sofre muito preconceito”, considera.
O estudo foi orientado pela professora Paula Teixeira Fernandes, que atua no Departamento de Ciências do Esporte e coordena o Grupo de Estudos em Psicologia do Esporte e Neurociências (Gepen). A Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) financiou os trabalhos, concedendo bolsa de estudo à pesquisadora.
“As pesquisas com atividade física e epilepsia são recentes, com maior ênfase nos últimos 20 anos. Além disso, há uma lacuna de estudos relacionando atividade física aos aspectos psicológicos. Neste sentido, vejo uma importância do meu trabalho, que abre caminho para outras pesquisas na área”, ressalta a autora da pesquisa.
Ela situa que dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que a diversas formas epilepsia afetam cerca de 50 milhões de pessoas no mundo. No Brasil, a prevalência varia entre cinco e quatro pessoas para cada 1.000 habitantes. Simone Kishimoto informa ainda que, conforme estudos sobre o tema, a alta incidência das epilepsias nos países em desenvolvimento é decorrente da deficiente assistência pré-natal e maternal, do alto índice de prematuridade, desnutrição, traumas durante o parto, convulsões febris da infância e de infecções, particularmente decorrentes de parasitismo.
“Apesar do tratamento terapêutico e medicamentoso, a condição social do doente acaba sendo amplamente esquecida e negligenciada. As crises imprevisíveis e, muitas vezes, dramáticas, fazem com que a sociedade tenha medo em lidar com as pessoas durante uma crise epiléptica. E o doente acaba sendo estigmatizado por apresentar uma característica diferente da aceita pela sociedade, sendo tratado, muitas vezes, com preconceito pela população. Isso faz com que muitos pacientes escondam sua real condição e se isolem socialmente, influenciando as relações sociais, oportunidades escolares e de emprego e aspectos emocionais”, conta. 

GRUPO AVALIADO

Os pacientes atendidos no Ambulatório de Epilepsia do HC foram divididos em dois grupos: ativos e não ativos fisicamente. A educadora física informa que os 80 pacientes adultos avaliados foram diagnosticados com epilepsia de lobo temporal associada à esclerose mesial. De acordo com Simone Kishimoto, este tipo de epilepsia possui alta prevalência entre adultos, sendo um dos tipos mais comum da doença.
“Dividimos em dois grupos segundo as classificações do International Physical Activity Questionnaire [IPAQ]: grupo ativo, composto por 61 pessoas e grupo não ativo ou sedentário, composto por 19 pessoas. Dos 80 pacientes, 49 são mulheres e 31 homens. Empregamos este questionário para avaliar os aspectos psicológicos e para cada um destes aspectos foi estabelecido uma escala de pontuação. Dentre os que mais tiveram melhora, pela ordem, foram: autoestima, qualidade de vida, sintomas depressivos e resiliência”, revela.

Autora: Simone Thiemi Kishimoto


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