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quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Live: SUDEP: saber ou não saber?

 


A ABE em parceria com a AAME irá realizar no dia 26/10 as 20h uma live com o tema: SUDEP: saber ou não saber?

No mês de conscientização sobre SUDEP vamos fazer um bate papo sobre a informação sobre SUDEP. O que as pessoas que convivem com a epilepsia pensam sobre este assunto delicado?


Neste encontro contaremos com a presença de:

Dra Aline Pansani (@profa.alinepansani ) Fisioterapeuta, professora na UFG e Coordenadora do grupo anti mortalidade em epilepsia;

Jessica Belo: Psicóloga e membro da AAME;

Heder Vieira: Professor, embaixador da ABE e membro da AAME;

Telma Lúcia Nunes Santana: Psicopedagoga.

O AAME (amigos anti-mortalidade em epilepsia) da ABE é um grupo voltado para educar e prevenir a mortalidade na epilepsia.


Será no instagram da ABE

@abe.epilepsia



quinta-feira, 2 de junho de 2022

'Tive medo de cair e morrer, mas a epilepsia mudou minha vida para melhor'

Na madrugada do dia 19 para o dia 20 de fevereiro de 2019, eu acordei assustada, com a visão embaçada. 'Você desmaiou e precisamos ver o que aconteceu', repetia minha mãe, sem parar, falando que estávamos indo para o hospital. No estilo daquelas cenas de filme hollywoodiano, do nada, eu me vi assustada, cheia de fios pelo corpo, numa cama de UTI. Tive duas convulsões em menos de 24 horas e, por caráter de emergência, a médica resolveu me internar para realizar dezenas de exames, pois poderia ser um tumor, um derrame, meningite?

Por conta das convulsões, fui medicada com Hidantal, um anticonvulsivo que tem como substância ativa a Fenitoína, cujos efeitos colaterais, entre eles náusea, letargia e vertigem, vieram com força e me deixaram dopada, com poucas lembranças da semana que passei internada. Passei por ultrassonografias, ressonâncias, punção lombar, coletas de sangue infinitas nos braços e até nas mãos. Foi só no último exame, o eletroencefalograma, que recebi o diagnóstico: epilepsia.

Uma convulsão por mês, durante um ano

Oi? Como assim? O que é epilepsia? Vou morrer? É contagioso? Essas e tantas outras perguntas foram feitas para o neurologista que me atendeu e deu a notícia. A epilepsia é uma doença em que há perturbação da atividade das células nervosas no cérebro, causando convulsões. Essa condição pode ocorrer como resultado de um distúrbio genético ou de uma lesão cerebral adquirida, como traumatismo ou acidente vascular cerebral. No meu caso, não tinha nenhum antecedente familiar e nunca havia ocorrido nada parecido na infância. Durante uma convulsão, a pessoa tem comportamentos, sintomas e sensações anormais, às vezes incluindo perda de consciência. No meu caso, novamente, quase não apresento sintomas pré-convulsivos e sempre acordo toda machucada, sem saber onde estou.

Ao todo, foram 13 convulsões em um ano, sendo seis delas enquanto dormia e sete enquanto estava acordada. A primeira em que eu estava desperta foi depois de um dia estressante, e só me lembro de acordar com pessoas em cima de mim. Esse episódio foi crucial para sacar que meus maiores gatilhos tinham uma conexão com meu estado emocional. Com um corte na cabeça, fui para o pronto-socorro, de Uber, com uma amiga, pois nenhuma ambulância, corpo de bombeiros ou polícia atenderam o chamado das pessoas que me acudiram na rua.


A epilepsia como aliada

O meu saldo de sequelas da epilepsia são duas lesões no ombro esquerdo, chamadas Hill-Sachs e Bankart, e cinco pontos na cabeça, dois na primeira e três na última convulsão, que aconteceu no dia 16 de abril de 2020. Fora os hematomas, dores, sessões de fisioterapia e o medo constante de cair e morrer. Até um pouco depois da última crise, vivi um período de negação, misturado com culpa e raiva. Sempre me cuidei, fiz exercício, comi bem, não fiz mal pra ninguém. Questionava Deus sobre os motivos de tudo isso estar acontecendo comigo, me sentindo um lixo por estar naquela situação.


Além de ir ajustando o Levetiracetam (que, atualmente, está em 2.250 g), remédio cuja dose foi aumentando a cada crise, adicionei o Clobazam, 20 mg, um ansiolítico e anticonvulsivante. A partir desse momento, passei, aos poucos, a controlar e entender minhas emoções e sentimentos, com uma importante ajuda da terapia, para melhorar o estresse, os rompantes de raiva e ansiedade.

Não tinha outro caminho: ou eu mudava minha vida como um todo, ou continuava aumentando as doses. Entendo que a frase 'a epilepsia mudou a minha vida para melhor' causa estranhamento nas pessoas. Porém, é uma doença sem cura, que exige disciplina e constante vigilância, e, a meu ver, é uma condição como diabetes e pressão alta, cujos cuidados são até parecidos: tomar remédios e mudar hábitos de vida. Foi o que eu fiz em todas as áreas.

Dormir bem, com boas horas de sono; fazer terapia semanalmente; comer bem; não beber e nem fumar; fazer exercícios físicos; saber o que me deixa feliz e o que me incomoda; valorizar mais as pessoas que me agregam e me afastar das que só fazem mal; e procurar outras formas de resolver meus desafios foram algumas das mudanças que eu fiz. 'Simples, todo mundo está nessa vibe', você pode pensar. Porém, estar é uma coisa, fazer é outra.


Cada segundo conta'

Com a maturidade rápida que ganhei com as convulsões, percebo que é muito delicado mudar pequenas coisas no nosso dia a dia, mesmo as que parecem mais simples. Aprendi a ser mais prática e, por meio da reflexão, tento encontrar formas rápidas e eficazes de resolver o que me faz mal. Quando entendemos que a morte é real/oficial, ou seja, quando passamos por episódios em que chegamos 'quase lá', acho que o tempo ganha um novo registro, o de que ele passa de verdade e não volta mais mesmo. Cada minuto da minha vida precisa ser para fazer e experienciar coisas boas, e, se não, para refletir sobre como melhorar ou resolver.

Esse foi o entendimento de tudo que aconteceu comigo. Outros pacientes são diferentes e está tudo bem. Cada um precisa passar pelo próprio processo de resolução. A epilepsia ainda é um tabu na sociedade, tanto que existem famílias que levam seus filhos e filhas para serem exorcizados, segundo um dos médicos que me atenderam na UTI. No entanto, com toda essa bagagem que carrego, procuro ajudar as pessoas com o diagnóstico, ouvindo suas histórias e, principalmente, levando informação correta.

Sei os privilégios que tenho, de ter acesso fácil aos medicamentos e aos tratamentos, mas faço questão de utilizar meu ofício de jornalista para abrir debates conscientizadores e me colocar à disposição para ajudar. É uma forma de retribuir tudo o que as pessoas fizeram por mim, de um jeito efetivo, para fazer uma mudança gradual, não só na vida dos epiléticos, mas também nas pessoas ao redor."


Tainá Goulart Gonçalves, 31 anos, jornalista




Fonte: Universa Uol









 

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Ketlen Wiggers revela epilepsia e diz que sofreu bullying por causa da doença

A maior artilheira da história do futebol feminino do Santos Futebol Clube, Ketlen Wiggers, revelou nesta semana, por meio de um vídeo publicado nas redes sociais, que tem epilepsia. Ela disse que foi alvo de piadas e sofreu muito após o diagnóstico, quando médicos apontavam que a atleta não poderia mais jogar futebol. Aos 30 anos e com a doença controlada, ela quer incentivar outras pessoas a falarem sobre a epilepsia e a viverem bem, sem preconceitos.

Ketlen tomou coragem para falar que tem epilepsia após ver o vídeo onde o ator Will Smith dá um tapa na cara de Chris Rock durante a cerimônia do Oscar 2022, após o comediante fazer uma piada sobre a cabeça raspada de Jada Pinkett Smith, mulher do ator. “Eu me senti no lugar dela, por todas as piadas que eu sofri em público. Eu não me defendia porque eu tinha vergonha de falar da epilepsia”.

As crises epiléticas são sinais e sintomas que ocorrem devido a uma descarga excessiva e anormal do cérebro. Entre as causas, estão: genética, AVC, infecções, lesões no cérebro, febre e, também, em alguns casos, não há diagnóstico fechado. A crise pode se espalhar e se tornar generalizada, levando à perda da consciência e convulsão.

A jogadora publicou um vídeo, em suas redes sociais, revelando sua condição, e comoveu muitos seguidores (veja a postagem abaixo). Ketlen descobriu a doença quando tinha 19 anos. A camisa 7 santista sofre com um tipo de epilepsia denominado de “crise de ausência”.

A atleta conta que, na época, ela conversava com as pessoas e, de repente, tinha um "apagão" por alguns segundos. Quando voltava, não lembrava o que estava falando. No início, ela tinha uma crise por semana. Depois, aumentou para duas por dia. O quadro piorou e Ketlen chegou a ter 40 episódios em um mesmo dia.

Eu estava na minha casa, em Santa Catarina, e minha mãe falou para eu ir à padaria. E nesse dia, eu estava muito mal, como se o remédio não estivesse mais fazendo efeito. Quando cheguei na padaria, eu não conseguia conversar com as pessoas. Na minha cidade, todo mundo me conhece. Eles estavam tentando conversar comigo e eu não conseguia, simplesmente a cada um minuto eu tinha uma epilepsia, eu saía fora do ar”, lembra.

A atleta conta que foi alvo de brincadeiras e piadas por ter epilepsia. Um dos episódios, segundo ela, ocorreu durante a época da faculdade, durante a apresentação de um trabalho. “Eu simplesmente esqueci o que estava falando. As pessoas começaram a rir de mim, até porque eu não sabia explicar o que estava acontecendo. Elas riam de mim, e eu fiquei quieta, saí da sala e não sabia o que fazer”, explica.

A atleta procurou por médicos em Santa Catarina, que diagnosticaram a doença e disseram que Ketlen não poderia mais jogar futebol. No auge da carreira, na seleção brasileira de futebol feminino e jogando no Santos, ela não aceitava o posicionamento dos médicos.

“Ele falou que simplesmente um epilético não poderia jogar futebol, que era impossível. Eu fiquei mal, lógico. Chorei muito. Minha mãe me deu muita força para que a gente fosse atrás de outros médicos, fomos atrás de outros para tentar ter uma mensagem positiva. Outro também falou que era impossível. E eu fui para São Paulo”, disse.

Na capital paulista, Ketlen foi atendida por um especialista em epilepsia. Ele receitou remédios para controlar os episódios da atleta e quis entender melhor a condição dela. A jogadora contou que nunca tinha tido crises dentro de campo.

“Nem ele entende a razão. Ele falou que, se eu nunca tive dentro de campo, que eu poderia continuar fazendo o que eu quisesse. Então, era a mensagem que eu precisava”, conta. Segundo ela, o médico suspeita que Ketlen fica muito concentrada nos gramados, o que evita que ela tenha crises dentro de campo.

Além de medicamentos, Ketlen realiza exames anualmente e tem acompanhamento psicológico desde o ano passado. Segundo a atleta, as sessões de terapia, onde ela pode desabafar e conversar sobre a epilepsia, lhe ajudam a enfrentar e conviver com essa condição.

Melhor coisa que eu fiz foi fazer terapia, porque eu tinha dificuldade de falar, de conversar com as pessoas. Eu fiquei muito no meu canto, no meu mundo, eu realmente me exclui de tudo. A terapeuta me ajudou muito a me abrir mais”.

Segundo Ketlen, sempre foi difícil lidar com as brincadeiras e piadas. Ela diz que isso resultou em medos e traumas. “Por isso que hoje eu tenho dificuldade de falar em público, tenho dificuldade de dar entrevista, porque eu tinha medo de ter epilepsia, de ouvir piadas novamente”.

Agora, Ketlen quer falar mais sobre a epilepsia. A atleta diz que deseja incentivar outras pessoas, que vivem na mesma condição que ela, a terem coragem de falar sobre o assunto, sem vergonha. E, além disso, que as pessoas parem com brincadeiras a respeito da doença.

“Eu, pessoalmente, sempre me senti muito mal com todas essas piadas que eu passei. Até hoje eu faço trabalho psicológico para tentar melhorar isso. E eu sei que é difícil. Foi muito difícil para mim no começo, e meu intuito foi acabar com essas piadas, para as pessoas entenderem que, na verdade, tem que estudar mais o tema, entender mais e entender que a gente é normal”, desabafa.

Ela diz que sua escolha foi não desistir do seu sonho de ser jogadora de futebol, apesar da negativa de vários médicos quando souberam que ela tinha epilepsia. “Eu não teria chegado aqui, eu não teria realizado todos esses sonhos que eu realizei, ser a maior artilheira do clube hoje, estar no muro, tantas conquistas que eu tive com o clube. Eu acho que a melhor mensagem é essa. Muitas pessoas vão dizer que não dá, que não dá para fazer o que a gente faz, mas se a gente desistir no primeiro não, a gente nunca vai chegar em lugar nenhum. Não desistam”, finaliza.


Fonte: G1

 

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Pacientes contam como conseguiram superar as barreiras da Epilepsia

 

Iasmin de Brito Pinheiro, hoje com 13 anos, sabe muito bem das dificuldades de viver com a epilepsia, doença em que neurônios disparam várias descargas elétricas no cérebro, resultando em perda de consciência súbita e movimentos involuntários de tempos em tempos.

Os primeiros sinais surgiram quando a jovem tinha apenas três anos de vida. Segundo sua mãe, a mercadóloga Liz Cristian de Brito, ela começou a apresentar crises sutis, bem diferente das clássicas, que são morder a língua, ranger os dentes e/ou ter dificuldade em respirar.

No caso de Iasmin, ela caía muito e não tinha estabilidade com as pernas desde que começou a andar. “Do nada, ela caía em atividades corriqueiras dentro de casa, como segurar um copo, colocar uma meia, arrumar um cabelo de boneca e até mesmo se vestir. Também apresentava picos de estresse, sem explicação", detalha Liz.

Como a menina começou a frequentar a escola ainda bem novinha, logo já fazia aulas de balé. No entanto, calçar e retirar as sapatilhas era uma dificuldade, e não por conta da falta de jeito, destaca Liz. Hoje, a família entende que era por incapacidade devido as crises que afetavam a sua coordenação motora e raciocínio.

“Ela não conseguia executar qualquer brincadeira que exigia um melhor raciocínio e coordenação. Todos achávamos que era falta de jeito, desastrada, desinteressada, até mesmo a pediatria que a acompanhava na época falhou. Eles pensavam que era um TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), ou coisas do tipo, o que retardou seu tratamento", conta a mãe da garota.

Assim como a adolescente, cerca de 50 milhões de pessoas são afetadas pela epilepsia no mundo, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, são cerca de 3 milhões de pessoas. Desses, por volta de 900 mil não conseguem controlar as crises da doença, diminuindo bastante sua qualidade de vida.

MAS, AFINAL, COMO FUNCIONA A EPILEPSIA?

O neurocirurgião Murilo Meneses, do Instituto de Neurologia de Curitiba-INC (PR), explica que a doença acontece pelo aparecimento de descargas elétricas das células do cérebro, conhecidas como neurônios, que podem se espalhar e provocar as crises epiléticas. Elas podem ter diferentes tipos, dependendo da localização e da forma como essas descargas se espalham.

Infelizmente, não existe uma idade específica para o aparecimento da epilepsia. De acordo com o médico, o problema pode surgir em qualquer idade, apesar de ser um pouco mais frequente na 3ª idade. As causas são diversas, podendo ser congênitas, hereditárias ou metabólicas.

A existência de um cisto, um tumor cerebral, uma hemorragia cerebral depois de um derrame, além de traumatismos cranianos estão entre os exemplos. "Dessa forma, fazer uma avaliação clínica e um exame é fundamental", destaca.

DESCOBERTA E MUDANÇA DE ROTINA

Foi exatamente o que fez o auxiliar de produção Marcos Henrique Alves da Costa, de 32 anos. Assim que começou a perceber alguns sinais diferentes, há 7 anos, ele decidiu procurar ajuda médica.

"Comecei a ter algumas crises em momentos de tarefas diárias. Sem entender exatamente o que estava acontecendo. Ao ir atrás, um especialista me explicou exatamente a causa e deu as sugestões de tratamento", conta.

Esse tipo de diagnóstico é realizado pelo médico neurologista, que deve fazer uma boa anamnese, analisando a história da pessoa. Isso será complementado por exames, como o eletroencefalograma e os de imagens, para detectar se existem lesões como pequenos tumores, displasias e cistos.

Descobrir uma doença, em qualquer idade da vida, não é nada fácil. Tontura, ânsia e mal-estar foram alguns dos sintomas que Marcos sentiu a princípio. Ele imaginava, porém, que era algo ligado à rotina corrida, que incluía trabalho, estudos e as preocupações com o noivado. "Como eram muitas coisas para eu pensar e programar, imaginava que todos aqueles sintomas eram relacionados ao estresse e cansaço", explica o auxiliar de produção.

Mas assim que recebeu o diagnóstico da epilepsia, tudo mudou. Nada de ir às compras, passear na rua ou jogar bola sozinho, sem a companhia de ninguém. Até mesmo as atividades físicas, que ele tanto gostava de fazer, deixou de lado. Apesar disso, assume que chegou a se arriscar algumas vezes. “Eu gostava de correr e jogar, e por conta do esforço e do medo de passar mal, deixei de lado. Mas, teimoso, fui jogar bola algumas vezes e tive crises", revela.

FORA DO NORMAL

Com Iasmim, o lado cognitivo foi o grande divisor de águas. Na escola, ela não conseguia executar direito a tarefa dada pela professora. Logo foi percebido que desenhos e atividades bem simples estavam fora da normalidade, se comparado a uma criança da mesma idade.

"Ela não evoluía cognitivamente, e, com isso, descobrimos que realmente existia uma situação  anormal. Daí iniciamos a investigação, passamos por várias especialidades médicas e, por fim, chegamos na neuropediatra, que no primeiro eletroencefalograma detectou inúmeras crises generalizadas", explica Liz.

"Com isso, tudo começou a fazer sentido: as quedas inesperadas, a dificuldade de aprendizado, a coordenação motora, a falta de evolução comportamental e o estresse", completa a mãe da menina.

Assim como Marcos, a rotina de Iasmin também mudou radicalmente. Além das inúmeras crises, que aconteciam durante o dia e a noite, a criança vivia 'dentro de uma bolha', segundo Liz: "Ela não tinha malicia alguma e precisava de fiscalização em quase tudo. Não sabíamos o que podia acontecer, então todos vivíamos tensos".

TRATAMENTO

O neurocirurgião diz que o tratamento medicamentoso para os pacientes com epilepsia é muito importante. Normalmente, 70% até 80% das pessoas com a doença terão um bom controle usando apenas os medicamentos. 

"Certamente que o especialista também vai analisar e ver qual é a medicação mais adequada para aquele paciente. Na maioria dos casos, porém, esse tratamento vai controlar as crises e permitir que a pessoa tenha uma excelente qualidade de vida no que diz respeito a epilepsia", afirma Meneses. 

De qualquer forma, é fundamental que as pessoas tratem a epilepsia. Caso não o façam de maneira adequada, elas podem ter crises que, eventualmente, causem problemas mais sérios, como traumatismos cranianos e pneumonia aspirativa, dentre outros, colocando a própria vida em risco.

A boa notícia é que, a pessoa tratando com os medicamentos corretos, depois de um certo tempo -em geral uns três anos- as crises podem desaparecer. “Aí o médico avalia a possibilidade de retirar a medicação e esse paciente pode estar curado.", afirma o neurocirurgião. 

CASO DE CIRURGIA?

Sim! Em casos considerados mais graves, a cirurgia pode ser a solução mais indicada. Um exemplo é quando o paciente tem uma pequena lesão no cérebro e que pode ser removida por uma microcirurgia. “Em um caso assim, a pessoa pode ficar curada e, inclusive, sem medicação", explica o médico. 

Meneses ainda destaca que existem epilepsias mais simples, outras mais graves e, dependendo dos casos, as cirurgias podem ser mais agressivas ou paliativas. "O interessante é que diversas técnicas mais modernas estão sendo desenvolvidas e podem dar um bom controle, sendo menos invasivas e mais sofisticadas", afirma.

 Tanto Marcos quanto Iasmin passaram pelo processo cirúrgico. No caso dele, depois de vários exames, os especialistas chegaram à conclusão que a opção mais viável seria mesmo a cirurgia. "Conforme o tempo foi passando, vi que as crises foram controladas e que eu já não tinha mais alguns sintomas, o que me fez voltar para a minha rotina normal", relembra. 

No caso da menina, que passou pela cirurgia em janeiro de 2018, muita coisa mudou de lá para cá, tanto na vida dela quanto na da família. "Eu temia não ver nenhum avanço e não desfrutar de melhoras, por menor que fossem. Aconteceu, porém, algo muito melhor. Não temos vivenciado mais tantas crises, ela está amadurecendo cada dia mais, evoluindo no ritmo dela, bem mais calma, controlada e prudente", elogia a mãe de Iasmin. 

PRECONCEITO

Meneses lamenta que, apesar de estarmos em 2021, o preconceito ainda exista quando se trata de epilepsia. Para o médico, a ignorância e falta de conhecimento sobre a doença contribuem para que isso ainda ocorra.

"O mais importante é a informação, é o conhecimento, a divulgação com dados corretos. Por esta razão, foi criado o dia internacional da Epilepsia, o 'Dia Roxo', celebrado em 26 de março, para que as informações sejam dadas e ajudem a reduzir a ignorância e o preconceito, mostrando para as pessoas com epilepsia que elas não estão sozinhas", diz o neurocirurgião.

Liz conta que Iasmin já sofreu e ainda sofre preconceito, principalmente na escola. E não é só por crianças, não! Ela é alvo também de adultos. “Infelizmente, na era da informação que vivemos, as pessoas eram para ser mais bem preparadas e esclarecidas. Essa educação deveria ser de berço, no mundo não deveria ter mais espaço para situações preconceituosas", conclui a mãe da menina.

Fonte: Uol Ana Maria


quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Superação:The Good Doctor em Cuiabá: estudante de medicina autista sonha em ser neurocirurgião

Lançada em 2017 e sucesso no Brasil em 2018, a série The Good Doctor mostra a história de Shaun Murphy, um residente de medicina portador do Transtorno do Espectro Autista (TEA), que sonha em se tornar um grande cirurgião e tem que lidar tanto com as suas dificuldades da síndrome quanto com o preconceito das pessoas em relação à sua escolha profissional.
Em Cuiabá, Enã Rezende Bispo do Nascimento, 26 anos, vive essa ficção na vida real. Diagnosticado com TEA aos 18 anos, apesar de ter vivido com a síndrome a vida toda, Enã escolheu aos 10 anos que seria neurocirurgião. Estudou, batalhou e em janeiro se formará em medicina pela Universidade de Cuiabá (Unic).
O grau de autismo de Enã é leve, mas ele possui alguns dos sintomas característicos do espectro, como o hiperfoco, a tendência a ficar mexendo as mãos, a hipersensibilidade sonora, tátil e às vezes fotossensibilidade, em que ambientes com muita luz o incomodam. Boates, por exemplo, em que há muitas pessoas, luzes e barulho, são locais difíceis para ele.

A descoberta

Na infância, Enã foi diagnosticado de forma errônea com psicose infantil. Quando pequeno, ele contou ter sofrido muito preconceito por parte das outras crianças e até dos pais delas. Além do autismo, à época não diagnosticado, ele também tinha desvaria, um distúrbio na fala que dificultava a pronúncia de algumas palavras.
“Na infância eu sofri muito. As crianças viam que eu era diferente, que eu era uma criança introspectiva, mas que tentava conversar, se aproximar. E eu tinha dislalia, não conseguia falar o ‘r’ vibrado, fazer o trator com a língua. Aí as crianças me achavam esquisito, falavam que eu era louco, retardado, deficiente e, às vezes, até os pais não me ajudavam, muito pelo contrário, falavam para os filhos: ‘fica longe daquele louco’”, lembrou.




Mas engana-se quem pensa que o bullying atrapalhou Enã. Segundo ele, as dificuldades somente o impulsionaram a se superar.
“Eu vi que eu tinha que me superar, que eu tinha que provar para todo mundo que eles estavam errados de pensar isso de mim. Eu percebi que só dependia de mim, que eu tinha que correr atrás, que tinha que tentar ser alguém. Foi uma superação, foi muito difícil. Até na época do cursinho muita gente tentou me desmotivar a fazer medicina”, contou.
O estudante disse que o lugar em que foi melhor acolhido foi a igreja – ele frequenta a primeira igreja Batista de Cuiabá. O pai era pastor, os avós também eram muito evangélicos, e, por isso, ele frequentou a igreja desde pequeno.
“É uma sensação tão boa, é um amor. Eu tenho um pouco de sensibilidade para essas coisas e consigo sentir a aceitação. Tanto que o barulho me incomoda, mas, estranhamente, os louvores da igreja não me incomodam. As orações, Deus na minha vida, tem sido fundamental para mim”, relatou.





O diagnóstico correto, de Transtorno do Espectro Autista, veio somente aos 18 anos, e foi recebido por Enã com uma mistura de alegria – por finalmente entender várias características de si mesmo – e tristeza – por perceber que tinha uma condição neurológica sem cura.

Medicina

A escolha da medicina veio cedo. Aos 10 anos Enã já sabia o que queria ser quando crescer. Quando ele tinha sete anos, seu pai morreu de traumatismo craniano, ao sofrer um acidente automobilístico, o que despertou sua vocação.
“Não sei bem se foi isso, mas foi uma das coisas que me direcionou. Porque eu adquiri muita curiosidade sobre como que ficou a cabeça dele”, afirmou. Enã queria entender o que houve e poder ajudar situações como a do pai. Ele acredita que o acontecimento ficou em sua cabeça e, depois de três anos, despertou a ideia de fazer medicina e se tornar um neurocirurgião.




Nascido em Umuarama (PR), foi depois da morte do pai que Enã veio para Mato Grosso, para ficar próximo da família da mãe, que é de Rondonópolis. Veio para Cuiabá cursar o 3º ano do ensino médio, fez cursinho em Goiânia (GO) e retornou para a Capital mato-grossense quando passou em medicina.
Começar o curso não foi fácil. A princípio, o estudante teve muitas dificuldades. Segundo ele, as pessoas não o entendiam, nem tinham paciência, mas com o tempo e a convivência, se acostumaram com as diferenças e o aceitaram.
Para colaborar com a aceitação, Enã precisou mudar sua socialização, até mesmo pensando na relação médico e paciente. Antes de entrar para a medicina, quando ainda estava no cursinho, em 2009, o estudante comprou livros de linguagem corporal para conseguir melhorar sua forma de lidar com os próximos e passou a estudar.
“Esses livros davam estratégias de socialização. Uma coisa que eu aprendi a fazer foi conversar olhando nos olhos das pessoas, que passa mais tranquilidade e confiança. Os livros dão uma série de dicas para você fazer o triângulo social, olhar nos olhos, olhar na boca, porque se você ficar o tempo todo só olhando nos olhos também não é legal”, disse.
Segundo Enã, atualmente, a maioria dos pacientes nem mesmo percebem que ele tem Transtorno do Espectro Autista. No começo ele tinha um pouco mais de dificuldade em falar com eles, mas, como começou a interagir com pacientes no 2º ano da faculdade, eles achavam que era nervosismo pela falta de experiência.




Faltando poucos meses para a colação de grau, Enã já está se preparando para as provas de residência. Ele pretende tentar a do Sistema Único de Saúde (SUS) de São Paulo, a do AMRIGS, que atende a hospitais do Rio Grande do Sul, e, em Cuiabá, do Hospital Geral Universitário (HGU) e do Santa Rosa, os dois hospitais da Capital mato-grossense que tem neurocirurgia.
Depois dos dois anos da residência, ele ainda enfrentará mais cinco anos de especialização em neurocirurgia.

The Good Doctor

Enã começou a assistir a série e acabou de terminar a primeira temporada. Desde que The Good Doctor ficou conhecida no Brasil, ele disse que muitas pessoas têm lhe comparado ao doutor Murphy. Aliás, até mesmo ele diz se reconhecer em muitos detalhes da série.
“Algumas coisas eu me vejo. O hiper foco, o fato de a gente não entender a linguagem conotativa, levar tudo mais para o literal, inclusive isso foi e é uma dificuldade minha, em relação a certas piadas”, contou.
Porém, diferente do Shaun, que não gosta de ser tocado, Enã gosta muito de abraçar. Ele afirmou que com algumas pessoas se importa em ser tocado e com outras não, mas que não sabe explicar como funciona a seletividade.


Enã, a mãe e o padastro, em seu ensaio de formatura


Na série, o personagem também tem a Síndrome de Savant, em que ele grava tudo que lê e lembra em detalhes. Enã disse acreditar que não tem, mas que, se tiver, é um grau bem leve.
“O que eu consigo lembrar são coisas da minha infância remota, de quando eu tinha um ano de idade. Eu lembro, mas quando eu conto para as pessoas, elas não acreditam. Aí conto para minha mãe e familiares e eles confirmam”, disse.
Além dessas características, o motivo que levou Enã e o personagem Shaun Murphy a se interessarem pela medicina também é parecido: ambos perderam pessoas importantes ainda na infância (Enã o pai e Shaun o irmão) e isso despertou a vontade de ajudar os outros a viver.
Uma das maiores vantagens em Shaun Murphy como cirurgião, sempre citada na série, é uma que Enã acredita ser também a sua maior vantagem como médico.
“O hiperfoco, na minha opinião, é minha maior vantagem na minha profissão. Vou sempre estar 100% focado na cirurgia, se tiver fatores emocionais, se acontecer algo antes, isso não vai me atrapalhar”, afirmou.





Assim como a série tem trazido a mensagem de que pessoas com Transtorno do Espectro Autista podem ser independentes e seguir qualquer carreira com excelência, Enã acredita ser um exemplo de que tudo é possível.
“Sinceramente, não existe nada que impeça a gente [autistas] de fazer o que quer fazer. Não só para medicina, mas para tudo que você desejar, tudo que você tiver vontade, você pode. Assim como o Bill Gates”, disse Enã, usando como exemplo o co-fundador da Microsoft, citado no livro “Thinking in pictures”, de Temple Grandin, como tendo características autistas.




Fonte: O Livre

quinta-feira, 28 de julho de 2016

Jornalista relata como convive com a epilepsia

Giliane Perin é formada pela Universidade Federal de Rondônia em Vilhena, e junto com seu pai comanda o jornal Tribuna Popular em Cacoal. Em um texto cheio de detalhes a jornalista conta como está aprendendo a conviver bem com a epilepsia. O relato pode tirar muitas dúvidas sobre o assunto e ajudar aqueles que também enfrentam a doença.

Conviver tem sido fácil, mas falar sobre sempre é difícil. Difícil principalmente pelo medo que tenho da reação das pessoas. Eu já me acostumei com a ideia, mas muitos ainda não entendem e até mesmo tem um certo preconceito, por mais que acreditem que não.
 A epilepsia é considerada uma síndrome neurológica, mas poderia muito bem ser encarada como uma doença como qualquer outra: tem suas causas (por mais que às vezes seja difícil identificá-las), tem seus sintomas e tem tratamento.
Ser epiléptica nunca me tornou pior do que ninguém, jamais! Tenho uma vida social ativa, trabalho e vivo muito bem. Claro que tenho preocupações! Até hoje tive apenas uma crise forte durante o dia (enquanto estava acordada) no restante, todas foram durante o sono (enquanto dormia). Mas conviver com a possibilidade de cair e me debater em frente às outras pessoas, confesso que não me agrada!
A crise epiléptica não se resume apenas às crises tônico-clônicas. O tipo de crise em que a pessoa fica inconsciente e tem contrações musculares involuntárias, bruscas e muito fortes. Nessas situações, é comum a respiração ofegante, dificuldade em engolir a saliva, mordedura da língua e algumas tantas outras situações. Dessas, eu já tive algumas e confesso mais uma vez: não são nada agradáveis.
Como disse, apesar da maioria dessas crises ter acontecido enquanto eu dormia, a sensação que me sobra quando a crise passa e eu volto “à realidade” são um tanto cruéis. Me sinto totalmente desorientada, sem saber e entender o que houve, uma dor insuportável toma conta da minha cabeça, muitas vezes a boca fica machucada (por morder a língua ou as bochechas), meu paladar é afetado (os gostos mudam por um ou dois dias) e muitos outros sintomas e sensações desagradáveis surgem.
Mas percebi, que com o passar do tempo, a gente mesmo se acostuma com a epilepsia. Na última crise que tive, acordei, entendi o que havia acontecido e tive (sabe-se lá o porquê) a consciência de não incomodar a minha mãe e deixá-la ir trabalhar. Foram tantas as vezes que ela parou tudo o que precisava fazer para ficar comigo, que na última, “consciente”, não quis incomodá-la!
Fiquei quietinha no meu quarto e depois de um tempo apenas pedi para que meu pai e irmã avisassem no trabalho que não poderia ir naquele dia. A partir do momento em que avisei, os dois passaram a me espiar de vez em quando e quando minha mãe chegou veio a bronca: “Nunca mais deixe de me falar”! Sabem como é uma mãe né? Mas enfatizo aqui o alerta da Dona Leane, não deixem de comunicar alguém próximo do que houve com você. No caso eu só avisei meu pai e minha irmã, pois estava “consciente” de que precisaria comunicar minha ausência no trabalho. Senão seria bem capaz de eu ter ficado sozinha, trancada no meu quarto e isso, como minha mãe bem disse, não pode!
Mas voltando a falar das crises, realmente engana-se quem pensa que a epilepsia trata-se apenas daquelas convulsões fortes, que realmente podem assustar qualquer um. Só que tudo vai muito mais além!
Como explica a Associação Brasileira de Neurologia em seu portal na internet, as crises podem ser de diversos tipos, conforme o comprometimento do hemisfério afetado. Um deles é a crise de ausência, quando o indivíduo fica estático e ausente, retornando em seguida, onde tinha parado. Devido a sua curta duração, dificilmente é percebida por familiares. Acho que já me ausentei algumas vezes…
As crises parciais podem ser simples ou complexas. Nos casos simples, o estado de consciência permanece inalterado. Nas crises parciais complexas o estado de consciência fica alterado, ou seja, a pessoa não consegue interagir com outras e não se lembra do que acontece no período da crise. Estas crises são provocadas por alterações localizadas em qualquer parte do cérebro, e portanto, causar os mais variados tipos de sintomas. Por exemplo, durante uma crise parcial simples a pessoa pode apresentar sensações de formigamento, contrações em um braço ou perna, e outros sintomas. Outros sinais são mal-estar, desconforto gástrico, medo sem motivo aparente e sensação estranha de familiaridade (dejà vu). Nas crises parciais complexas, a pessoa pode ficar confusa, fazer gestos mecânicos de mastigação e continuar exercendo a tarefa que estava realizando de modo automático.
Há, também, as crises tônicas, clônica, mioclônica – marcada por abalos musculares que se manifestam, predominantemente, no período matutino – além de outras, que somam mais de trinta no total.
Nas inúmeras leituras que fiz até aqui sobre epilepsia, descobri que me encaixo em uma quantidade bastante considerável de sintomas, dos citados acima, por exemplo, já experimentei praticamente todos.
Mas não pense você que isso me impede de ser ou fazer o que eu quiser. Faço de tudo, apenas quando necessário é que tenho uma certa atenção redobrada. Mas confesso também: já não me sinto a mesma menina animada de alguns poucos anos atrás. Às vezes me falta ânimo, motivação. Mas ainda não sei se posso por essa culpa na epilepsia ou na velhice que a cada ano aumenta. Vai ver é só a idade…
Pois bem, até aqui muitos podem se perguntar por que estou escrevendo tudo isso… Pois digo: por preconceito! Já senti muita vergonha por ter epilepsia e como falei, muitos são preconceituosos em relação a essa doença. Não que eu tenha sentido na pele isso, até porque os poucos que até então sabem deste probleminha são pessoas próximas. Mas é que de tanto ler sobre o assunto, vejo que o maior problema enfrentado por pessoas epilépticas é o preconceito. Preconceito não apenas dos outros em relação a nós, mas preconceitos que surgem em nós mesmos. Preconceito que eu mesma tive e ainda estou tentando superar, por exemplo em relação ao novo medicamento que o meu neurologista me receitou!
Até aqui eu fazia uso de apenas um medicamento, mas o Depakote, a partir de um certo momento, passou a não ser mais tão eficaz para controlar minhas crises. Então ele me receitou o medicamento, que não só ele como tantos neurologistas, reconhecem como um dos mais eficazes. Medicamento que muitas vezes deixa de ser receitado pelo preconceito que os próprios pacientes tem em relação à ele: o Gardenal!
Sim, eu comecei a fazer uso deste remédio e superado o susto e preconceito inicial, deposito nele toda a minha esperança… Afinal, se os remédios começam a não dar conta de controlar a epilepsia, hoje em dia com a medicina avançada, a cirurgia já se torna uma boa opção… Só que confesso que ao ouvir isso do médico, o reboliço em meu estômago foi bem maior! Então voltamos às minhas esperanças: Como informa a sua própria bula, “o Gardenal é indicado para prevenir o aparecimento de convulsões em indivíduos com epilepsia, assim como, para prevenir crises convulsivas de outras origens”, então por que o preconceito?
Quando meu neurologista me indicou o Gardenal, eu me apavorei e me chatiei sim. Senti forte na pele e no coração o preconceito que eu mesma tinha ao remédio indicado para garantir o meu próprio bem. Como muitos, e não se faça de espertinho, eu relacionava o Gardenal ao tratamento de “loucos”. Por isso questionei o médico em relação à péssima fama deste remédio e ele me explicou que o Gardenal foi muito usado, décadas atrás, em doses excessivas para “conter” e “acalmar” pacientes internados em hospícios, por ter também um efeito sedativo. Acontece que davam para estas pessoas doses até 10 vezes maiores do que o aconselhável para este medicamento, o que simplesmente acabava por “dopar” os pacientes. E como naquela época os tratamentos não eram como são hoje em dia, era muito mais simples “sedar” os pacientes e mantê-los “calmos”, sem incomodar mais ninguém. Então se era louco: tacá-lhe o Gardenal para acalmar.
E foi num papo muito bacana com o médico que vi que o que eu sentia pelo Gardenal era realmente puro preconceito. Preconceito mesmo, daqueles bem toscos! Claro que ainda não superei completamente a ideia de estar tomando Gardenal, porque por mais que eu entenda a sua indicação, sei que a maioria absoluta a desconhece e já fico aguardando um momento em que um amigo, na inocência, chegue até mim e sem imaginar solte aquela brincadeirinha famosa e corriqueira: “Vai lá tomar seu Gardenal”. Aí eu vou simplesmente informar: “É só a noite que eu tomo o meu (meio comprido diário de) Gardenal”.
Então está aí, obrigada a quem leu meu relato até aqui. Minha intenção foi perder literalmente o meu próprio preconceito ao Gardenal e encarar de frente a epilepsia! Espero que essa minha “coragem” em relatar o que eu enfrento, motive outras pessoas que tenham epilepsia ou qualquer outra doença da qual possam se envergonhar. A vergonha está dentro de nós, eu resolvi encarar de frente e dar um “passa fora”!

Fonte: Correio de Notícias