quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Vincent Van Gogh e a epilepsia

Considerado como um dos mais importantes pintores expressionistas da história, Vincent van Gogh produziu uma obra incomparável, caracterizada pelos traços fortes e vigorosos, realçados por cores intensas, retratando situações de grande emotividade. O pintor nasceu em Groot Zundert, Holanda, em 1853. Recebeu o nome que seria dado a um primeiro irmão natimorto, o que pode ter sido o início de uma trajetória de vida marcada por uma intensa mistura de símbolos de aniversário e morte. Sua mãe era descrita como intolerante, e seu pai, como um pastor sacrificado e mal-humorado. Van Gogh teve cinco irmãos. Vários apresentaram, ao longo da vida, distúrbios psiquiátricos e neurológicos, como depressão, ansiedade, esquizofrenia e "demência paralítica". Segundo relatos posteriores, o pintor cresceu sentindo-se "feio e desajeitado". Na idade adulta, seu temperamento foi descrito como depressivo, conturbado e auto-punitivo. Não há relatos de relacionamentos satisfatórios com as mulheres. Aos vinte anos, apaixonou-se pela chefe de sua irmã, e, já nessa época, eram claros os sinais de depressão. A seguir, muitas outras relações aconteceram, inclusive com uma prostituta, para quem ele pintaria a tela "Sofrimento". Van Gogh morou em Paris durante dois anos com seu irmão, Theo, onde conheceu diversos artistas, dentre eles Toulousse Lautrec, que lhe apresentou a bebida absinto. A bebida era consumida por diversos artistas, na época, os quais se diziam, sob ação da mesma, mais perspicazes para a criação artística. Somaram-se ao absinto o uso de nicotina e diversas bebidas alcoólicas. A partir desta época, o pintor passou a apresentar recorrentes episódios psicóticos, muitas vezes iniciados por sensação de pressão na cabeça, seguida geralmente por agitação psicomotora, alucinações e auto-agressão (chegou a mutilar a pópria orelha), sendo hostilizado pela população, que o tratava como "louco" e chegava a lhe atirar pedras na rua. Durante os intervalos entre as crises, cada vez mais freqüentes, van Gogh voltava a pintar, e as novas obras retratavam, de forma cada vez mais realista, seu mundo interior conturbado, descontínuo, solitário e angustiado. Alguns relatos obtidos em cartas escritas para seu irmão Theo remetem à possibilidade do diagnóstico de doença de Menière, especialmente quanto às vertigens episódicas, zumbidos e perda auditiva transitória, desequilíbrio, náuseas e intolerância ao barulho. A possibilidade de que van Gogh fosse portador de epilepsia do lobo temporal, com crises parciais complexas, é controversa. A favor, há a história de crises intermitentes, separadas por intervalos de lucidez, sendo caracterizadas por manifestações de caráter emocional (principalmente depressivo), alucinações, perda de identidade e impulsos autodestrutivos. Outras características da personalidade do artista remetem à chamada "personalidade epiléptica", como alterações da sexualidade, irritabilidade, hipergrafia, temática emocional recorrente centrada em religião e filosofia, hipermoralismo ou misticismo. Alguns aspectos contradizem a hipótese de epilepsia do lobo temporal, tais como o tempo excessivo de duração das crises, manifestações de esquizofrenia psicótica, com depressão, ansiedade, pensamentos paranóicos e estados dissociativos. Há também o relato dos diagnósticos de sífilis, transtorno bipolar e esquizofrenia paranóide. O abuso de álcool e absinto, associado às más condições nutricionais, pode ter influenciado negativamente sobre as condições neurológicas e psiquiátricas do artista. Além disto, não havia tecnologia disponível e não houve critérios rigorosos para o estabelecimento do diagnóstico de epilepsia, inclusive nos relatos relativos ao período em que o artista se internou numa clínica em St. Remy, onde se tratavam "lunáticos e epilépticos". Após uma vida marcada por intenso sofrimento psíquico, Vincent van Gogh se suicidou aos 37 anos, na França, levando consigo a incerteza acerca do seu diagnóstico definitivo, mas deixando uma obra única, inimitável e, acima de tudo, de extrema auto-expressividade emocional.

Referencias: Kaufman I, Arenberg L, Countryman LF et al. Vincent's Violent Vertigo. Acta Otolaryngol

Nenhum comentário:

Postar um comentário