“Foi a melhor sensação da minha vida.” É assim que Soares descreve a lembrança da infância quando pegou a primeira onda. Em seguida, ela entrou na escolinha de surfe de Ubatuba (SP), onde mora, e aos dez anos participou da primeira competição da cidade.
A experiência fez com que a jovem desenvolvesse o espírito de competidora e quisesse passar a vida nos grandes torneios da modalidade. “Foi uma fase muito boa até os meus 13 para 14 anos, quando meu professor, Juliano, teve que se mudar e eu me deparei sozinha”, lembra.
A sensação de abandono fez com que Soares parasse de participar de campeonatos. Junto a isso, ela passou a ter crises convulsivas, o que mais tarde acarretou no diagnóstico de epilepsia.
“Foi uma descoberta na minha vida em que me deparei com a consciência de que não conseguiria seguir com o surfe e ser uma atleta. Cheguei a ter nove crises por dia. Foi um momento difícil tanto para mim quanto para minha família”, reflete.
Segunda a neurologista Rachel Marin de Carvalho, membro da Liga Brasileira de Epilepsia, a crise epiléptica acontece quando há uma descarga elétrica excessiva e ao mesmo tempo em um grupo de neurônios do cérebro.
“Alguns tipos de crise são sutis como uma perda breve da consciência, outros têm fenômenos motores que vão desde abalos sutis e breves de um só membro, até abalos generalizados que podem ser acompanhados de mordedura de língua, hipersalivação e liberação esfincteriana [perda involuntária de fezes e/ou urina]. A duração e a intensidade são variáveis de acordo com cada tipo de crise”, completa Carvalho.
O tratamento com canabidiol e o retorno ao surfe
Além do desgaste com as crises epilépticas, Soares conta que o tratamento inicial, com medicamentos como carbamazepina, gardenal e topiramato, a debilitava bastante.
“Para uma pessoa que era difícil tomar remédio, comecei a ficar fraca. Eu não tinha vontade de fazer atividades diárias e minha memória não funcionava bem. Acabei me entregando para a doença”, lembra.
Até que, aos 15 anos, ela conheceu a cannabis por meio de médicos da família. A aceitação do remédio, que deriva da maconha, foi difícil pelos pais da atleta serem evangélicos e porque, na época, os estudos envolvendo o fármaco ainda estavam ganhando força. Ainda assim, Soares iniciou o tratamento e, após seis meses, viu o resultado.
“Ao iniciar uma crise e pingar as gotas do remédio, em um intervalo de um minuto, começou a fazer efeito. Durante as minhas crises convulsivas, eu me debato, é muita contração muscular e eu fui relaxando com a cannabis”, relata.
Carvalho detalha por que o canabidiol é uma possibilidade de tratamento para epilepsia: "A cannabis exerce ação anti-epiléptica no cérebro por múltiplos metabolismos, agindo na redução da excitabilidade neural e em última instância na frequência de crises". Como no caso de Soares, o medicamento é indicado quando os fármacos tradicionais já não têm bons resultados.
Hoje, a atleta usa o canabidiol três vezes por semana e completou um ano sem crises epilépticas.
A cannabis salva vidas, assim como salvou a minha. Minhas crises ficaram estáveis, minha memória foi voltando e retornei à atividade física."
— Luana Soares, atletla profissional de longboard
O canabidiol permitiu que Soares voltasse a surfar, só que, dessa vez, com a prancha de longboard, que é maior e trouxe mais segurança à atleta.
Gradativamente, ela foi retomando a confiança no surfe, arriscando manobras e pôde sonhar novamente em tornar-se atleta profissional. Atualmente, Soares coleciona títulos como campeã do Circuito Brasileiro de Longboard (2024) e do Circuito Paulista Profissional (2024), além de bicampeã sul-americana do WSL Longboard Tour (2023/2024) e do Circuito Ubatuba Pro (2022/2023).
Hoje, ela está se preparando para competir o WSL Longboard Tour 2025, um circuito mundial com etapas nos Estados Unidos, Austrália, Emirados Árabes Unidos e El Salvador. Apesar dos títulos significativos dentro da modalidade, Soares está arrecadando dinheiro por meio de uma vaquinha devido à dificuldade para conseguir patrocínios.
Fonte: Marie Claire
Nenhum comentário:
Postar um comentário