Episódios têm começado aos quatro meses de vida, segundo neurologista Ana van der Linden
Epilepsia precoce. Mais uma doença relacionada à Síndrome Congênita do Zika, como vêm sendo chamadas as complicações em bebês cujas mães foram infectadas pelo vírus durante a gestação. Além de terem nascido com microcefalia, boa parte desses bebês começou a ter crises convulsivas já nos primeiros meses de vida. O aumento desses casos chamou a atenção dos especialistas, já que é um novo desafio à saúde dessas crianças.
Enquanto cientistas buscam explicações, os pais lançam mão de
alternativas. O leque de ambos os lados envolve remédios tradicionais,
dietas especiais, receitas caseiras e até mesmo o extrato de Canabidiol,
que é derivado da maconha. A microcefalia, forma mais clássica de dano
ao desenvolvimento embrionário das crianças ocasionada, já acumula 7.534
notificados no Brasil. Desses, 1.947 estão em Pernambuco, que tem 354
confirmações.
Cinquenta por cento. Esse é o percentual de bebês microcéfalos atendidos
pela neurologista Ana van der Linden que começaram a apresentar
epilepsia precoce. Os episódios têm começado aos quatro meses de vida.
“Eles fazem o que a gente chama espasmos. E esses espasmos se repetem
três, cinco, dez vezes. O conjunto deles se chama uma salva. Ou seja,
eles podem ter várias salvas por dia”, explica.
Diferentemente das crises conhecidas de epilepsia, nas quais os
pacientes caem, ficam arroxeados e com o corpo batendo, nas dos
microcéfalos a contração é do corpo todo. Geralmente, segundo a
neurologista, dobram o corpo para frente. E quando a crise passa, vem o
choro. “As crises desses bebês têm muita relação com o estado de
sonolência, quando se está acordando ou adormecendo”, detalha sobre o
padrão observado.
O cérebro dos bebês, acrescenta, têm muitas calcificações. Ou seja,
partes que foram destruídas. Nessa área de necrose não se desencadeiam
os estímulos neuronais. Contudo, áreas próximas que não foram totalmente
destruídas ficam “sofridas” e não têm uma resposta adequada. “A crise
epilética é a descarga exagerada desses neurônios, nessa área que está
entre a parte necrosada e a parte normal também ficou doente. Isso
facilita o desencadear dessas crises.”
Riscos
Essa desregulação, segundo a neurologista, não traz risco de vida
imediato.No entanto, aumenta o risco de morte súbita. Ela alertou que
durante as crises o bebê pode se engasgar com a própria saliva ou mesmo
sufocar ao se debruçar no berço.
Na tentativa de minimizar as crises, a médica tem lançado mão de
anticonvulsivantes. Mas os resultados são pouco animadores. As crianças
têm apresentado a epilepsia de difícil controle. “As medicações
normalmente não têm uma resposta adequada e quando muito reduz o número
de crises, mas não controla totalmente. Temos que ir tentando os
remédios.”
Confirmação
Quem conhece bem essa realidade é a dona de casa Micaela Souza, 26 anos,
mãe de Annika, 7 meses. As crises começaram quando a menina,
diagnosticada com microcefalia ao nascer, estava perto dos cinco meses.
Ela teve a confirmação da epilepsia depois de um exame de
eletroencefalograma.
“Annika não tinha essas crises. Começou a ter não sei se pela idade ou
por outra coisa. Hoje percebo muitas crises. Qualquer hora do dia.
Geralmente é mais quando ela está comendo ou querendo pegar no sono”,
contou.
Depois de consulta médica e do diagnóstico, Annika começou a tomar
anticonvulsivantes. Foram vários remédios, mas sem sucesso. “Esse
último, que ela começou a tomar há algumas semanas, deu uma leve melhora
na irritabilidade. Mas continua tendo muitas crises.”
Dieta cetogênica
Micaela acredita que se os remédios convencionais não forem eficientes à
filha possa iniciar a dieta cetogênica. Ela ouviu outras mães que têm
filhos com epilepsia comentarem sobre esse tratamento. “Elas disseram
que as crises reduziram”, comenta. O Imip tem, há um ano, um ambulatório
específico para atender pacientes que buscam a dieta contra a
epilepsia.
A neuropediatra Adélia Souza, que é presidente da Liga Brasileira de
Epilepsia e integra a equipe do ambulatório, reforçou que a alimentação
que é a base de gordura é uma opção terapêutica para qualquer paciente
de epilepsia de difícil controle, seja ele microcéfalo ou não.
“É uma dieta balanceada em que se inverte a entrada na energia no
cérebro. Ao invés da energia vir da glicose, do carboidrato, como
substrato de energia, o cérebro recebe como gordura. É como se
estivéssemos enganando o cérebro. Você dá uma dieta rica em gordura e o
cérebro entende que o corpo está em jejum, pois ela imita o jejum.”
A médica destaca que a ciência ainda busca mais informações sobre essa
alimentação. Mas já é fato que ela tem um componente anti-inflamatório e
diminui a irritabilidade do cérebro. Um estudo internacional, de 1998,
avaliou 150 crianças submetidas à dieta cetogênica para o tratamento da
epilepsia e mostrou controle total das crises em 16% dos pacientes,
redução acima de 90% das crises em 32% e, ainda, redução acima de 50%
das crises em 56%.
Fonte: Folha de Pernambuco
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